um espectáculo de Joana Craveiro | Teatro do Vestido
digressão 2024 | 50 anos do 25 de Abril
M/12
duração 6h30 (aprox.), jantar incluído
Foto ©Estelle Valente
0. Frio
Revisitamos hoje, Junho de 2024, o nosso Museu Vivo. Ao longo dos últimos 13 anos (a investigação para este espectáculo começou em 2011), muita coisa aconteceu. Na verdade, e como sabemos, as coisas não deixam de acontecer em permanência, e a isso se chama história (escrevo aqui com h pequeno; faz-me sentido). Não é por isso que o arrepio de medo e de frio e de ânimo e de expectativa é menor quando estamos prestes a abrir a porta a 6 horas desta viagem.
O frio está cá. Ele vem da vontade de querer fazer isto convosco.
1. Reconstituição
Esta é talvez a décima folha de sala que escrevo para este espectáculo, e em todas me parece importante explicar como tudo isto começou: Este projecto parte de uma investigação sobre memórias, narrativas, construções e imagens de 88 anos da história de Portugal, a partir da instauração da ditadura militar (1926) que iria dar origem ao Estado Novo (1933), e prolongando-se até às comemorações dos 40 anos do 25 e Abril de 1974, em 2014. Depois disso, continuámos sempre a pesquisar e a tomar notas no nosso caderno, e a recolher mais e mais histórias pessoais.
2. As pequenas memórias
Porque não sou historiadora e este não é um projecto de história; porque procurei encontrar vozes cuja história não estava acessível no espaço público nem nas narrativas que estão fixadas nos manuais de história (com H grande, dizem); porque procurei escavar e desenterrar a minha própria relação pessoal, familiar e geracional com tudo isto; porque, quando estreámos, estávamos no meio de uma crise financeira que nos diziam por vezes sem precedentes e outras vezes com antecedentes e estava difícil de perceber como tínhamos chegado até ali e quando é que as coisas tinham começado a correr tão mal – por estas razões e outras, a expressão “memórias pequenas” está no título do espectáculo. Gosto de pensar que não “dei voz aos que não têm voz”, porque acredito que todos têm voz, várias vozes, até. Prefiro o verbo amplificar.
3. 6 horas
É mais ou menos isso. Menciono a duração porque ela é importante e define uma boa parte do que este espectáculo é ou tenta ser: um mergulho. Não encontrámos forma de o tornar mais curto; pelo contrário, foi-se tornando mais longo (denso?) desde a sua estreia em 2014, com adendas, notas de rodapé, histórias improváveis, um fragmento sobre a emigração portuguesa para França que nos foi proposto pelo Thêatre de la Ville e o São Luiz Teatro Municipal – e essas tais coisas todas que não deixam de acontecer, mesmo que nós as queiramos fixar num texto teatral e repetir sempre as mesmas palavras, as mesmas linhas de texto, como se só tivessem acontecido aquelas e não outras depois disso. A vida, simplesmente, não é assim. Não pára. Aos acontecimentos sucedem-se outros acontecimentos e outras (novas) formas de os entender.
4. É preciso referir
Nestes últimos dez anos, também, o próprio teatro português e a sua relação com a memória, com a história, com o documental, com os arquivos, com as histórias de vida, foi-se desenvolvendo e florescendo com uma pungência que o ano de 2014 – o das comemorações dos 40 anos do 25 de Abril – não deixava adivinhar. Embora mais timidamente, isto tem sido acompanhado pelo próprio Estado e pelas suas políticas da memória – essa coisa sobre a qual nada sabíamos até há uns anos.
Uma das boas notícias deste 50º aniversário do 25 de Abril é a inauguração do nosso primeiro museu nacional dedicado à memória: o Museu Nacional Resistência e Liberdade, na Fortaleza de Peniche.
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Um museu vivo de memórias pequenas e esquecidas tem navegado momentos políticos vários da história presente do país ao longo destes últimos 10 anos, sempre na mesma convicção de que a memória – essa coisa frágil que nos constitui – deve ser fixada, preservada, transmitida, questionada, também – e amplificada (já o disse mais acima). Memória aqui escrita no singular com m pequeno que é na verdade grande (M), e que pretende significar o seu plural: Memórias. Não há duas iguais, e não se conseguirá falar de todas. Estas são as que foram fixadas neste trabalho que é uma homenagem a isso mesmo: às experiências reais e memoráveis de um conjunto de pessoas que generosamente as partilhou comigo – convosco.
Joana Craveiro (escrito na ortografia antiga)
Investigação, texto, direcção e interpretação: Joana Craveiro Colaboração criativa e assistência: Rosinda Costa (na versão de 2014-16) e Tânia Guerreiro Figurinos: Ainhoa Vidal Desenho de luz, adaptação técnica, operação: João Cachulo Montagens: Cristóvão Cunha Operação de som: Igor de Brito Montagens e assistência vídeo: João Pedro Leitão Operação de vídeo: Henrique Antunes Direcção de produção: Alaíde Costa Apoio: Estêvão Antunes, Francisco Madureira Apoio técnico: FX Roadlights Co-produção: Teatro do Vestido, Negócio / ZDB, São Luíz Teatro Municipal Apoios: Citemor – Festival de Montemor-o- Velho, Alkantar Digressão com o apoio: Abril é Agora
Um Museu Vivo de Memórias Pequenas e Esquecidas estreou-se em 2014, no contexto da Tese de Doutoramento de Joana Craveiro. A realização da tese contou com o apoio de República Portuguesa – Ciência e Tecnologia, Fundação para a Ciência e Tecnologia, QREN – Quadro de Referência Estratégico Nacional, UE – Fundo Social Europeu.
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