A Gaveta


Partindo de um conjunto de fotografias de uma família anónima, compradas numa feira de velharias, e em simultâneo do seu espólio pessoal de imagens de família, Joana Craveiro reflecte sobre os usos pessoais, políticos, familiares e afectivos das fotografias. E também sobre a materialidade destes objectos num mundo cada vez mais imaterial. Como Christian Boltanski disse, “Hoje em dia morremos duas vezes: a primeira quando morremos de facto; a segunda, quando já ninguém sabe quem somos numa fotografia.” O que é que uma colecção cuidadosamente legendada diz sobre a vida desta família anónima de uma possível classe média baixa, no Portugal do final dos anos 50, até aos anos 70? Que transformações na paisagem, na política, nas relações de género, e nas dinâmicas familiares podem ser intuídas naquele conjunto de imagens? E, porque acabaria uma colecção destas numa feira, vendida a uma desconhecida? A colecção pessoal de Joana Craveiro, por seu turno, longe do nível de conservação da colecção adquirida, está na posse de um elemento familiar com alguma ligação às imagens (a própria Joana). A vontade de preservar não existia desde o início; mas a colecção foi preservada, não obstante. Ficou ‘na família.’

Gaveta é uma viagem poética pela materialidade das memórias pessoais, lançadas ou lixo, vendidas em feiras, ou escondidas nalguma gaveta de uma família. Um dueto com a composição musical de Francisco Madureira, e em que estas imagens como que pediam a Joana Craveiro que as ‘olhasse outra vez,’ que as contasse.
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